201209.10
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As principais mudanças ao Código do Trabalho

As mudanças que agora entram em vigor não são as primeiras, nem serão as últimas na legislação laboral. No início do ano foi criado um regime excepcional que permite a renovação extraordinária dos contratos a termo certo que atinjam os limites legais até 30 de Junho de 2013. As compensações por despedimento também já tinham sido reduzidas para 20 dias por ano para os trabalhadores que iniciaram funções depois de Novembro de 2011.

Prevê-se que esta norma seja novamente alterada em breve, já que a partir de Novembro deste ano as compensações deverão ser alinhadas com a média europeia passando a ser de oito a doze dias por cada ano de trabalho.

Entre as alterações mais relevantes ao Código do Trabalho estão a eliminação de férias e feriados, o corte nas horas extraordinárias, a redução das compensações para 20 dias, a introdução do banco de horas por negociação individual e a redução do montante das compensações.

Extinção de posto de trabalho

A lei 7/2009 de 12 de Fevereiro previa que num grupo de pessoas com funções idênticas, o empregador tinha que respeitar determinados critérios de antiguidade (despedimento em primeiro lugar os que têm menor antiguidade no posto de trabalho, na categoria, na empresa, ou que pertencem a classe inferior de uma mesma categoria). Estes critérios são agora com a entrada em vigor da Lei 23/2012 de 25 de Junho substituídos por qualquer outro que seja “relevante e não discriminatório”, elimina-se assim o critério legal. Elimina-se também a obrigação de colocar o trabalhador num posto compatível com a sua categoria profissional, facilitando assim os despedimentos por extinção do posto de trabalho.

Despedimento por inadaptação mais abrangente

O despedimento por inadaptação vai passar a ser possível ainda que não tenham sido introduzidas alterações no posto de trabalho. Deste modo abre-se a porta ao despedimento por inadaptação quando haja uma modificação substancial da prestação de trabalho que se traduza, por exemplo, na “redução continuada de produtividade ou de qualidade”. Já nos casos dos cargos de “complexidade técnica” ou de direcção, este despedimento poderá passar a ter lugar pelo mero incumprimento de objectivos. A lei prevê, no entanto, que o despedimento só possa ocorrer por incumprimento de objectivos fixados depois da entrada em vigor da lei. Também aqui se elimina a obrigatoriedade de colocar o trabalhador num posto de trabalho compatível com a sua categoria profissional. Estava previsto no Memorando de Entendimento com a Troika que o despedimento por inadaptação fosse ainda mais flexível o que abriria a possibilidade de estender a todos os trabalhadores o regime de inadaptação quando houvesse objectivos acordados e não cumpridos, por culpa do trabalhador. Mas cedo esta opção foi posta de parte, pelo que este regime continuará a estar restrito (como até aqui) a cargos de complexidade técnica ou direcção.

Organização do tempo de trabalho – Banco de horas por negociação individual

O regime do banco de horas pode agora ser instituído por acordo entre o empregador e o trabalhador, podendo o período normal de trabalho ser aumentado até duas horas diárias e atingir 50 horas semanais, tendo o acréscimo por limite 150 horas por ano. A
lei veio estabelecer que o empregador deve fazer uma proposta por escrito, presumindo-se a aceitação por parte do trabalhador se o trabalhador não se opuser por escrito nos 14 dias seguintes ao conhecimento da proposta. O banco de horas vem permitir que o trabalhador aumente o seu período efectivo de trabalho diário em alturas de picos ao serviço da empresa, sendo compensado com horas livres, com mais férias ou com um pagamento em dinheiro (de valor que pode ser inferior à compensação por horas extraordinárias). No regime anterior, este mecanismo só podia ser introduzido por negociação entre as associações sindicais e patronais do sector, mas com a entrada em vigor das alterações ao Código do Trabalho passa a poder ser negociado directamente entre trabalhador e empresa. Na pevisão legal não é necessário que todos os trabalhadores estejam de acordo: se 75% dos trabalhadores de uma equipa, secção ou unidade económica estiver de acordo, o banco de horas estende-se aos restantes 25%. O legislador optou pelo alargamento do âmbito subjectivo que se aplica não só aos que subscrevem o acordo como para os trabalhadores que recusaram esta proposta. A figura do banco de horas já existia na contratação colectiva, e também aqui se facilitava a aceitação por apenas uma parte dos trabalhadores da equipa, secção ou unidade económica (75%).

Trabalho suplementar e trabalho normal em dia feriado – alterações introduzidas

a) Eliminação do descanso compensatório por trabalho suplementar prestado em dia útil, dia de descanso semanal complementar ou dia feriado (prevê-se ainda a nulidade das disposições de instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho e as cláusulas de contratos de trabalho celebrados antes da entrada em vigor da presente lei que disponham sobre esta matéria);

b) Redução para metade dos acréscimos remuneratórios devidos pela prestação de trabalho suplementar (em dia útil – redução para 25% pela primeira hora ou fracção e 37,5% por hora ou fracção subsequente; em dia de descanso semanal e feriado – redução para 50% por cada hora ou fracção);

c) Redução para metade (i) do acréscimo de retribuição devido por trabalho normal prestado em dia feriado em empresa não obrigada a suspender o funcionamento nesse dia (i.e. redução para 50% por cada hora ou fracção) e (ii) da duração do descanso compensatório pelo qual o empregador poderá optar em alternativa (i.e. metade do número de horas trabalhadas);

d) Suspensão, durante dois anos a contar da entrada em vigor da presente lei, das disposições de instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho e das cláusulas de contratos de trabalho que disponham sobre (i) acréscimos de pagamento de trabalho suplementar superiores aos estabelecidos no Código do Trabalho e (ii retribuição do trabalho normal prestado em dia feriado, ou descanso compensatório por essa prestação, em empresa não obrigada a suspender o funcionamento nesse dia. Decorrido este prazo sem que as referidas disposições ou cláusulas tenham sido alteradas, os montantes por ela previstos são reduzidos para metade, não podendo, porém, ser inferiores aos limites estabelecidos pelo Código do Trabalho.

Compensação no despedimento

Até ao ano passado, os despedimentos colectivos, por extinção de posto de trabalho ou por inadaptação, entre outros, davam direito a uma compensação equivalente a 30 dias de salário-base e diuturnidades por ano trabalhado, com o limite mínimo de três meses e sem qualquer limite máximo. Já a cessação de contrato a termo dava direito a dois a três dias de salário por mês trabalhado.

Numa primeira alteração ao Código do Trabalho que já está em vigor, estipula-se que os trabalhadores que assinaram contrato depois de 1 de Novembro de 2011 apenas têm direito a uma compensação de 20 dias de salário-base e diuturnidades por ano trabalhado (contra os anteriores 30 dias), sem limite mínimo e com o limite máximo de 12 salários ou €116.400,00 ao contrário dos 30 dias previstos na Lei 7/2009.

A segunda fase da redução das compensações é concretizada na lei que entrou em vigor a 1 de Agosto e abrange todos os trabalhadores. Assim, no caso dos trabalhadores contratados antes de 1 de Novembro de 2011, a compensação passa a ser calculada segundo duas componentes.

A primeira componente determina que todo o trabalho prestado até 1 de Novembro de 2012 continue a ser contabilizado de acordo com a fórmula antiga (30 dias de salário por cada ano trabalhado, com o limite mínimo de 3 meses de salário). Já o trabalho prestado depois de 1 de Novembro de 2012 passa a ser calculado segundo a nova fórmula (20 dias de salário, sem limite mínimo e com limite máximo de 12 salários ou 116,4 mil euros). Se o trabalhador já tiver ultrapassado este último limite, mantém os seus direitos, mas não acumula mais direitos para o futuro. Neste sentido as alterações quanto a esta matéria apenas se farão sentir em pleno nos próximos anos.

Numa terceira fase, que deverá ser concretizada ainda no decorrer do ano de 2012, o valor vai voltar a mudar entre oito a doze dias por cada ano trabalhado, no entanto serão mantidos os direitos adquiridos. Isto significa que um trabalhador que labore há vinte anos, por exemplo, mantém o direito a vinte meses de salário. No futuro, porém, não acumulará mais. Para quem está na empresa há pouco tempo, continuará a acumular, mas de forma mais lenta, até que sejam atingidos os limites. Por outro lado um trabalhador que mude de empresa passará a ser abrangido pelos valores mais baixos.

Estas medidas terão efeitos importantes na competitividade da nossa economia, e na criação de uma verdadeira cultura de mérito e produção no trabalho.

Exemplos práticos:



Redução de férias

  • Eliminação, a partir de 1 de Janeiro de 2013, da majoração de (até três) dias de férias por assiduidade. Esta medida terá carácter imperativo sobre a disposições de instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho e cláusulas de contrato individual de trabalho que sejam posteriores a 1 de Dezembro de 2003 e anteriores à entrada em vigor da presente lei, as quais sofrerão uma redução em montante equivalente até três dias;
  • Admissibilidade do encerramento, total ou parcial, da empresa para férias dos trabalhadores nos dias de “ponte”, desde que o empregador informe trabalhadores abrangidos, até ao dia 15 de Dezembro do ano anterior, do encerramento a efectuar no ano seguinte;
  • Previsão expressa de que sempre que os dias de descanso do trabalhador coincidam com dias úteis, são considerados como dias de férias, em substituição daqueles, os sábados e os domingos que não sejam feriados.
  • Se os dias de descanso do trabalhador coincidirem com os dias úteis, estes não contam para efeitos de contabilização de férias. Em vez disso, contam os sábados e os domingos. Esta norma não tem impacto no número de dias de descanso, mas pode interferir na marcação de férias.

Feriados

Eliminam-se quatro feriados obrigatórios: o Corpo de Deus, o 5 de Outubro, o 1 de Novembro e o 8 de Dezembro. A medida contudo só terá efeitos a partir de 2013.

Faltas

Em caso de falta injustificada a um ou meio período normal de trabalho diário, imediatamente anterior ou posterior a dia ou meio-dia de descanso ou a feriado, o período de ausência a considerar para efeitos de perda de retribuição corresponderá à totalidade desse período.

Alterações ao “layoff” – redução ou suspensão em situação de crise empresarial

As empresas que recorrerem ao regime de redução ou suspensão de laboração em situação de crise empresarial (“layoff”) terão a partir de agora que ter a sua situação regularizada perante a Segurança Social, excepto quando estiverem em situação económica difícil ou em processo de recuperação de empresa. Além disso, terão que prestar mais informação contabilística e financeira ao Ministério da Economia e aos trabalhadores. Estabelecem-se agora restrições ao despedimento num prazo de um a dois meses seguintes ao “layoff”, excepto para contratados a termo, e por outro lado, limita-se a aplicação de figura jurídica do “lay off”, ou seja, a empresa só poderá voltar a recorrer à aplicação das medidas de redução ou suspensão depois de decorrido um período de tempo equivalente a metade do que foi utilizado, excepto quando os trabalhadores estiverem de acordo. Em contrapartida, o processo terá prazos mais curtos e a renovação da medida poderá ocorrer ainda que os trabalhadores não estejam de acordo.

Durante o período de redução ou suspensão, os trabalhadores têm direito a uma compensação equivalente a 2/3 da sua retribuição normal ilíquida, ou ao valor do salário mínimo correspondente ao seu período normal de trabalho, com o valor máximo de 1.455,00€ (incluindo o salário que possam receber de outra empresa). A Segurança Social paga 70% do salário devido aos trabalhadores enquanto a empresa assume os restantes 30%. Os apoios previstos à frequência de formação profissional, que antes constavam de legislação avulsa, ficam agora definidos no Código do Trabalho: IEFP paga o correspondente a 30% do IAS (ou seja, 125,7€), em partes iguais, ao trabalhador e ao empregador.

Fiscalização das condições de trabalho e comunicações à ACT

Com as novas alterações legislativas as empresas terão menos obrigações no envio de informação à Autoridade para as Condições de Trabalho, nomeadamente no que toca a questões relacionadas com os horários de trabalho. Deixa de ser obrigatório enviar à ACT o mapa de horário de trabalho, o acordo de isenção de horário ou o regulament de empresa, por exemplo. O requerimento para redução ou exclusão do horário de descanso passa a ser tacitamente aprovado e as comunicações prévias ao início de actividade serão simplificadas. Em contrapartida, as empresas passarão a ter que comunicar a adesão ao fundo de compensação do trabalho, um mecanismo destinado a financiar parcialmente as compensações, que ainda não está regulamentado.

Descentralização da negociação colectiva

Os contratos colectivos podem passar a estabelecer que matérias como a mobilidade geográfica e funcional, a organização do tempo de trabalho e a retribuição passem a ser definidas por outra convenção colectiva, nomeadamente ao nível da empresa.

Além disso, a associação sindical passa a poder conferir à estrutura de representação colectiva dos trabalhadores poderes para, relativamente aos seus associados, contratar com empresa com pelo menos 150 trabalhadores (em vez dosactuais 500).

Contratos orais de curta duração serão mais longos

Os contratos de muito curta duração, mais utilizados na agricultura ou no turismo, por exemplo, poderão passar a durar 15 dias, com um total de 70 dias de trabalho por ano co o mesmo empregador. Actualmente estes limites são de sete dias e de 60 dias de trabalho por ano. Este contrato não está sujeito a forma escrita.

Comissão de serviço

A nova lei prevê que o regime de comissão de serviço possa ser alargado a mais funções de chefia. Para isso, é necessário que o contrato colectivo o preveja. A comissão de serviço pode cessar por iniciativa de qualquer das partes, mediante aviso prévio por escrito com antecedência mínima de trinta dias (se a comissão durou até dois anos) ou sessenta dias (se a comissão durou mais de dois anos).

O novo diploma estabelece que a alteração só se aplica a funções de chefia que tenham início depois da entrada em vigor da lei.

Regime do trabalhador-estudante tem novas regras

Os trabalhadores-estudantes que fizeram horas extraordinárias terão direito a um descanso compensatório equivalente a metade do trabalho prestado. Por outro lado, poderão acumular até três dias livres em períodos de prestação de provas. Além disso, deverão fazer prova no estabelecimento de ensino da sua condição de trabalhador-estudante. Este regime ainda será regulamentado e as alterações também deverão afectar os funcionários públicos, já que as regras serão harmonizadas.

Outros aspectos importantes

Com as alterações legislativas que entraram em vigor consideram-se nulas as disposições de instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho que prevejam montantes superiores para a compensação por despedimento ou que estabelecem majoração ao período anual de férias. E as cláusulas que determinem um pagamento mais generoso das horas extra ficarão suspensas por dois anos.

Departamento Laboral da ACFA

Pedro da Quitéria Faria

pf@acfa.pt

Cristina Viegas

cv@acfa.pt