201204.17
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Artigo de Opinião sobre a Proposta de Lei nº 39/XII que altera o Código da Insolvência e Recuperação de Empresas

Negociação, negociação, negociação…. Sem dúvida que esta á a palavra que mais se adequa a várias reformas legislativas que estão em curso. No entanto, como o que aqui estamos a versar são as alterações ao CIRE (Código da Insolvência e Recuperação de Empresas), convém fazermos uma alusão histórica, em particular, ao então apelidado CPERF (Código do Processo Especial de Recuperação da Empresa e de Falência).

Com efeito, a grande alteração que agora se discute prende-se com o facto de ter sido recuperada a ideia que estava subjacente ao CPERF e que era a sua própria ratio legis, ou seja, as empresas e as próprias pessoas singulares devem, se possível, ser recuperadas e não, no caso das empresas, liquidadas.

Com efeito, desde logo, o Artigo 1º muda radicalmente o seu caminho, porquanto, na actual lei, refere que o processo de insolvência é um processo de execução universal que tem como finalidade a liquidação do património de um devedor. Já na proposta que se encontra em fase de aprovação, o processo de insolvência é um processo de execução universal que tem como finalidade a satisfação dos credores pela forma prevista num plano de insolvência, baseado, nomeadamente, na recuperação da empresa.

Com tal desiderato, nasce aquilo a que a nova lei apelida de Processo Especial de Revitalização (PER). O processo terá o seu inicio com a manifestação de vontade do devedor e de, pelo menos, um dos seus credores, no sentido de se iniciarem negociações, que não poderão exceder os três meses. Durante este período, e este sem dúvida que é um aspecto muito relevante, suspendem-se as acções que que estejam a correr, assegurando-se assim, a necessária calma para a reflexão e para a criação de um verdadeiro plano de recuperação.

Este processo tem a virtude de poder ser submetido à homologação do tribunal, já com o plano todo aprovado pelo requerente e credores, ou seja, se durante o já citado período de 3 meses forem encontrados mecanismos de recuperação podendo, inclusive, por acordo dos envolvidos, mas sujeito às maiorias previstas no código, serem indicados novos gestores que não os constantes da lista de Administradores judiciais, ao Juiz cabe o poder/dever de homologar o acordo alcançado. Desta forma, o poder do juiz coloca-se no plano da fiscalização e não da tutela do processo.

Quando, durante as negociações que correm fora do tribunal, não se tenha logrado obter acordo conducente à revitalização do devedor, duas hipóteses se configuram: se as negociações forem encerradas e o devedor não se encontrar, nesse momento, em situação de insolvência, o processo será extinto, deixando de produzir quaisquer efeitos; se, ao invés, o devedor já se encontrar, nessa fase, em situação de insolvência, deve o administrador judicial provisório, após ouvir o devedor e os credores, requerê-la, fundamentadamente, ao tribunal, devendo o juiz apreciá-la e declará-la no prazo de 3 dias úteis. De realçar o facto de que está prevista uma limitação da utilização deste PER, ou seja, para que o processo não seja utilizado de forma abusiva, em concreto, para não servir como instrumento dilatório de não cumprimento de obrigações, se o devedor desistir deste processo, não poderá recorrer ao mesmo durante um prazo de 2 anos.

Sem prejuízo desta ser, sem dúvida a alteração mais relevante, outras são alvo desta proposta de Lei. Assim, está previsto um reforço da responsabilidade do devedor, bem como dos seus administradores de direito ou de facto no caso de estes terem sido causadores da situação de insolvência com culpa; prevê-se uma tramitação mais simplificada para a efectivação das reclamações de créditos; encurtam-se vários dos prazos previstos actualmente, em particular, reduz-se de 60 para 30 dias o prazo de apresentação voluntária à insolvência; a reclamação ulterior de créditos só poderá ser feita nos 6 meses subsequentes à declaração de insolvência; a impugnação da resolução de negócios a favor da massa insolvente também é reduzida a metade, ou seja, é fixado um prazo de 3 meses em vez dos actuais 6 meses; também a resolução de negócios em benefício da massa insolvente sofreu um corte dos actuais 4 anos, para 2 anos. Outra das novidades consiste em transformar o incidente de qualificação da insolvência de carácter obrigatório, num incidente cuja tramitação está dependente de provas carreadas para o processo de que a situação de insolvência provém de culpa do devedor ou dos seus administradores de direito ou de facto. Uma última palavra para a alteração prevista e que respeita ao veículo de publicidade de dos actos
relativos ao processo de insolvência passar a ser o Citius, em detrimento do Diário da República Electrónico.

Fernando Antas da Cunha

ac@acfa.pt